domingo, 18 de novembro de 2007

A Ponte



A Escola. Eu conheço uma escola, e nem nunca for preciso de lá ir para a conhecer, que é diferente de todas as outras Escolas, diferente mesmo, tão diferente quanto deveriam ser diferentes todas as outras Escolas umas das outras…

A vida requer e oferece tantas Escolas, e nós insistimos em fazer de todas elas, uma.
Não percebo porquê, mas queremos ensinar a todos o mesmo, em salas todas iguais, nos mesmos métodos, pelos mesmos manuais, pelos mesmos exames, e depois no fim deste processo realizado em série, dizemos que um determinado aluno é um número de 0 a 20, e a que a nossa Escola aparece na posição X do ranking Nacional, para quê?
Se a nossa Escola, se a Escola que a esmagadora maioria frequentou e frequenta fosse verdadeiramente eficaz, um aluno neste sistema educativo não era mais que uma das milhares de peças iguais feitas em série que a escola vomita cá para o mundo exterior. Se a Escola que vivemos fosse mesmo eficaz, a tendência, era que todos nós soubéssemos as mesmas coisas, fazendo de todos nós, um só!
Mas, não é só a tendência uniformizadora do produto final que a nossa única Escola fabrica que faz dela perversa
apenas por esse facto em si, não é apenas porque ensinamos a todos o mesmo da mesma maneira, que faz da nossa escola perversa, mas é também, porque é dessa cega maneira que a Escola olha para os seus alunos, fazendo de cada um do aluno seguinte, igual ao anterior. E é neste olhar igual e indiferente da Escola onde nascem a maioria das diferenças. Não há duas pessoas iguais logo não há dois alunos iguais.
Temos que repensar a nossa Escola, a Escola que temos demonstra-se incompleta, incompetente, exclusiva, não temos uma escola que seja de todos e para todos, mas cada vez mais, temos uma escola de alguns e para outros alguns.
Julgo poder-se medir sem erros grosseiros a saúde social de um país, medindo directamente o estado de saúde da sua Escola. É na Escola que nos fazemos, onde vivemos as primeiras diferenças, as primeiras dificuldades. A Escola não é só onde aprendemos a ler e a fazer contas, é lá que aprendemos, ou poderemos aprender a ser. É na Escola que se ensina o civismo, aprende-se a ser civil lá. Mas como se pode aprender a sê-lo, se ela se desresponsabiliza desse seu principal papel a toda a hora interessando-se apenas em fazer das pessoas números, dos números pessoas?
Como pode então um Estado estar á espera que o seu povo seja cívico, que esteja consciencioso das regras e funcionamento de jogo da democracia e da vivência em grupo, se esse se coíbe de as ensinar? Não só temos que ensinar como também temos de as demonstrar e de comprovar a sua validade se queremos que elas se perpetuem. Como queremos que tenhamos crianças/homens com sentido de justiça e de solidariedade se a Escola nos remete para outros caminhos, os da competição, o do salve-se quem puder, onde prevalece a velha e óbvia historia dos mais “fortes” que têm mais fortes probabilidades de se segurar…
Infelizmente o Homem não é inatamente solidário nem justo, esse são valores que ganham sentido na vivência com os outros, só temos que ser solidários e justos quando vivemos em sociedade, por isso, é que é em sociedade, que vamos aperfeiçoando esses valores, e, que sem eles, as sociedades ou se desmoronam, ou sobrevivem acorrentadas em ignorantes pobrezas.
Os pilares da sociedade não são justamente esses, a justiça e a solidariedade? Não deveriam ser esses pois, os pilares da nossa Escola? Não devia ser a escola primeiro que tudo solidária e inclusiva? Que sentido faz ter uma vida em sociedade, se não sabemos, nem nos ensinam a viver nela?
As nossas Escolas funcionam como verdadeiras prisões fechadas em si próprias, até nos espaços físicos a semelhança é notável, os muros, as grades, as salas de aula todas iguais, o toque da campainha… A Escola tal como a temos não passa de uma prisão com dois objectivos apenas, o primeiro, reter os alunos por ali para que os pais possam ir trabalhar sossegados e o outro é o de educar, entendendo-se aqui educar como sendo a básica tarefa de preparar “os mais capazes” para os exames. Aos menos capazes fica-se apenas pela retenção, enquanto ela for possível…
É assim que é para nós educar? Para a nossa Escola, educar não passa de preparar um dado individuo para uma hora e meia defronte de um determinado número de questões? A educação deve ser o instrumento mais abrangente e poderoso de uma sociedade e só uma educação autónoma, cooperativa, solidária e participada, se pode sentir no direito de pedir responsabilidades aos socialmente responsáveis por seus eventuais actos. Como podemos então permitir que seja a Escola a própria a castrar a educação tornando-a tão redutora?

A Escola. Eu conheço uma escola, e nem nunca for preciso de lá ir para a conhecer, que é diferente de todas as outras Escolas, diferente mesmo, tão diferente quanto deveriam ser diferentes todas as outras Escolas umas das outras…E essa escola até tem um nome, e nem é como a maioria das outras que têm nomes de pessoas que para os próprios alunos delas são ilustres desconhecidos. Esta tem um nome bem mais comum e bem mais bonito. Esta que eu conheço que é diferente das outras chama-se: Escola da Ponte e tem como projecto Fazer a Ponte.
Conheci esta escola à uns anos atrás, dado a conhecer pela minha irmã, que acabando ela a sua licenciatura num curso de ensino e frequentando as cadeiras sobre didáctica teve conhecimento e realizou em trabalho sobre esta escola. Foi com tão enorme entusiasmo e comoção que ela realizou tal trabalho, que acabou por passar para mim alguma de toda a enorme esperança que traz conhecer um projecto com este. Deste primeiro namoro com o conhecimento da Escola da Ponte consumou-se a leitura do livro “Quando for grande, quero ir á Primavera” da autoria do professor José Pacheco mentor da Escola da Ponte.
Desde aí que esta escola não me saiu da cabeça, ficou-se me para sempre na ideia ser possível haver uma escola que levasse todos os meninos quando crescessem, para uma Primavera. Passados estes anos todos, que já lá vão alguns, relembrei-me desta escola e foi com enternecimento com que li as informações que consegui obter dela na net. Aconselho vivamente a lerem os link’s que estão ao dispor neste post (Escola da Ponte (vídeo) e Fazer a Ponte) para terem uma melhor noção do que vos falo.
E então para acabar, e para os mais preguiçosos que não queiram ler os link’s, deixo um brevíssimo resumo sobre a dita escola e alguns excertos que julgo deliciosos extraídos dos tais link’s.
A Escola da Ponte é uma escola reinventada por um grupo de professores liderado pelo já referido José Pacheco, no ano de 1976 na localidade de Vila das Aves, Santo Tirso. Tem como principais características: ser uma escola aberta, onde se incentivam que as fronteiras aluno-professor-pais-sociedade sejam de livre circulação, e que visa explorar a unicidade de cada aluno e apelar e aperfeiçoar o seu sentido de solidariedade.
Um exemplo notável que demonstra bem todo o processo educativo desta escola, é que o momento da avaliação só acontece quando assim o aluno o pretende, e entre os muitos instrumentos utilizados para a avaliação um deles é o
“Registo das Disponibilidade, no qual o aluno regista a sua disponibilidade para ajuda de colegas. Por vezes o aluno que se disponibiliza prepara, por iniciativa própria, trabalho ajustado ao colega que quer ajudar”.
Um outro instrumento de avaliação e também este notável, é que os alunos podem tecer comentários e juízos á própria avaliação sendo também esses usados na avaliação das suas atitudes. E é desses comentários que queria deixar uns excertos que julgo fenomenais e demonstrativos do poder de uma escola com esta.

Para os mais interessados, relembro que há mais comentários que estes, aqui ficam só alguns…

(Não se esqueça o caro leitor no seguimento e envolvimento da leitura dos comentários que se seguem que estes são dirigidos ao fantasma, que para os alunos costuma ser a avaliação)

“Do que eu não gosto é de que, ás vezes, eu não faço tudo e porto-me mal e dizer isso na avaliação é um bocado chato”

“Se eu não escrevesse a verdade, estava a ser injusta para os meus colegas”

“Faz-nos ter pensamento e sermos pessoas”

“ (…) Foi importante ser boa aluna muito tempo aprender os gráficos e descobrir como sou. Aprendi coisas da vida, que eu não sabia que existiam. Aprendi a corrigir os meus erros e a minha memória. Relembrei como se trabalha em liberdade e como se faz a avaliação de um trabalho, como se tira as coisas da cabeça e se aprende a não copiar. Aprendi a fazer as coisas com imaginação e a encher uma folha com coisas importantes.”

(Relembro também o caro leitor que se tratam de textos de crianças os que acabei de parafrasear)


Notável não é?

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